Logo que demos a receita de um suco de couve com batatas cruas, a ser tomado todos os dias, pela manhã, para que lhe fossem aliviadas as dores de estômago, a mulher ficou-nos eternamente grata na fila do supermercado.
Era véspera de Natal; acredito que o afeto ali concedido lhe tenha sido seu maior presente. Porque assim eram as coisas que, muitas vezes, destruíam-nos ou nos salvavam num determinado dia; não as dietas milagrosas, mas as pessoas e as suas solidões minimamente expostas.
O que a sociedade tem a nos oferecer é muito pouco. Uma ínfima porção do que podem representar as ondas nervosas de sonhos tempestuosos, donde surgem as criações esplêndidas que nos fazem sentir a vida apaixonante.
Apenas dentro de mim eu poderia encontrar não as respostas às perguntas que constantemente as faço, porém o fio que me puxa para frente, de forma a sempre continuar interrogando, sem nunca repetir as mesmas frases; nas lápides dos sepulcros repousam os pontos finais, tão somente.
Às vezes, para nutrir-me com o que a sociedade não me fornece, faz-se absolutamente necessário que eu me afaste da infecção dos ares alheios; em outras, por outro lado, que me jogue no meio das multidões, e aperte a mão do primeiro vizinho. Assim componho uma complexão equação, cujo resultado nunca será solvido: não poderia, por essa perspectiva, ser como Schopenhauer, um pessimista brilhante; ou otimista, no entanto, com idealismos que não enxergam o necessário nas coisas.
O que sou, então? Sou amor-fati, um furto constante ao que existe ao meu redor para preencher, sem misticismos, o vazio que sempre irá haver dentro de mim.
Autor: Lucas Vinícius da Rosa