O texto é como uma cadeira; deve ser bem sustentado, por quatro pernas; necessita ser belo, de beleza que incite bom projeto; precisa, também, ter bom estofamento, pelo obséquio do conforto daquele que o lê. Assim espero que seja este texto. E espero muito, não pouco, que quem se assentar nele caia jamais. Ninguém que cair da cadeira, nem ter ela puxada. Por isso continuo escrevendo, de pé ou sentado.
Façamos a prosa em pé, portanto. Quero estar impávido durante alguns parágrafos. Mas, por favor, queira se sentar. A cadeira é o próprio texto, como já disse.
Imagine agora uma cadeira numa sala histórica, de paredes largas e demasiado espaçosa. Nesta cadeira vou fazer sentar primeiro Napoleão Bonaparte. Antes de sentá-lo, porém, digo que ele levou a mão ao estômago. Talvez tenha tomado muito arsênio no dia anterior. Mazelas do exílio.
O segundo a sentar-se na minha cadeira foi Sócrates. Sentou, mas logo se levantou. Era inquieto. Perguntava o porquê de cada perna da cadeira. Não entendia como ela se sustentava. Ou se compreendia, queria saber o porquê da compreensão. Anos depois, fiquei sabendo que ele havia criado uma legião de fãs, que perguntavam para tudo, e atendiam pela alcunha de socráticos.
Houve um outro indivíduo, um terceiro, que assentou-se depois. De feição de causar horror no mais inexpressivo dos rostos, Robespierre aconchegou-se na cadeira. Estou tendo trabalho em tirá-lo da mesma posição; ele refuta todos os que contrariam seu modo de sentar; guilhotina é a sua maneira jacobina de dizer: “sou a liberdade, igualdade e fraternidade, e vou te matar se não fores liberto como eu, meu irmão”.
Se a cadeira tem quatro pernas, vou sentar nela uma quarta personalidade. Numa troca de e-mails, semana passada, correspondi-me com Machado de Assis, que não foi quem sentei em quarto lugar. O autor gaguinho emprestou-me Brás Cubas, em uma estimada gentileza. Devo retribuir um dia; talvez quando defunto eu lhe retorne alguns vermes, em agradecimento.
Brás Cubas chegou solteirão, velho e cheio de prosa para os versos da sua vida. Quando não estava morrendo, ou falando sobre Quincas Borba, narrava estórias a respeito de damas abaixo de dezesseis anos. Parou de respirar e escreveu um livro. Isso foi depois que levantou-se da cadeira, por sinal.
Agora, se me permite, leitor, vou me sentar também. Estou de pé, como Ernest Hemingway, a escrever a fio. Exauri o espírito das palavras. Vou me sentar na cadeira que criei, acho que a fiz suficientemente bem.
Autor: Lucas Vinícius da Rosa.