Prenda-me se for capaz

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Houve este dia em especial, tão ordinário quanto os outros, ao passo que as paisagens eram deixadas para trás como sempre o são, em que percebi as prisões como impossíveis de serem construídas ao meu redor. Porque as trocas de cela as fazia sempre eu entre a razão e a emoção.

Porém, quando abri mão de carregar um molho de chaves no bolso (automaticamente porta alguma abrir, ou arrombar), encheu-me o peito vazio a sensação de tijolos se esfarelando, construções a desabar sobre as cabeças dos pequenos grandes homens, vis fabricadores de portões e placas de boas-vindas às cidades do pecado ou paradisíacas; eufemismos muito superficiais para homens que habitam as profundidades.

Havia um sofrimento com um quê de belo nascendo nas paisagens áridas, e o verdejar apagado de antes tornou-se colorido, porque simplesmente meus olhos escolhiam sonhar uma visão que tivesse outra cor; não nasci num filme preto e branco; muito menos entre paredes as quais detêm os ossos parados, em atrofia, ou assentados em cadeiras de conhecimento inquestionável, a ordenar-me uma educação que ensina toda a ordem possível menos a de amar, ainda que sejam as minhas partes mais danificadas.

O amargo desejo de fugir dos lugares senti, primeiro como se me assoprassem a pele, depois como uma porrada no rosto, subtraído pelo desaparecimento das mentiras férreas com que me marcaram a alma.

Sem poder ser preso, sem ser réu ou vítima da razão ou emoção, poderia então apenas respirar o vazio da vida, preenchendo, com meus pulmões, toda a criação possível pela individualidade que voa como um pássaro atlântico, devolvendo a abundância, sem o receio do esgotamento por ser compartilhada.

Quem seria insano o suficiente para empreender-me a prisão, se estivesse ocupado tomando o exemplo? Prendam-me se forem capazes!

Autor: Lucas Vinícius da Rosa