Eu sinto muito

blood-drop

Costumava me sentir triste diante do nascer do sol. Neste dia, em especial, não chorei quando ele surgiu. Não me despertei com lágrimas secas em jejum no travesseiro, ou com vontades as quais não poderia cumprir. Neste dia, eu vivi. Prometi a mim mesmo que, não importasse o que acontecesse, e levando em consideração que a vida é um rabisco num quadro, poderia pintar um dia o que nem mesmo Picasso poderia conceber. Compus, neste mesmo dia, cinco músicas. Ou minto, fiz uma coletânea. Não que soassem corretamente sonoras, mas ressoavam o ritmo do meu coração. Não me importava se afinado ou do contrário eu fazia; era importante simplesmente o sentimento de saber que eu poderia tocar algo. Como uma criança, que sem a ciência que sua infância finda, arca com as consequências de sua ilusão, mesmo assim.

Nas sortes que tive, arriscando-me pelo risco sem medida, fui tão mais eu quanto se não fosse. Porém, qual a graça em não desafiar o que já não se mais poderia ser? Vejo tantas janelas espedaçadas, encobertas por cortinas pomposas, e vidros remendados, sem seus pedaços mais minúsculos, que penso: “nisto eu nasci?”. Depois, passada a diáspora da cólera que tudo quer ter como sintoma, e em nada vê cura, posso adoecer outra vez pela febre da minha própria doença.

Se existem amores mortos, não lembro de ter comparecido aos seus enterros. Sendo cerimônia deverás mórbida, optei por simplesmente amar novamente. Não que fosse mais fácil. Mas eu poderia sorrir, ao menos, na cerimônia seguinte; sem os prantos fúnebres congelados pelo inverno que já passou.

Há muitas desistências ao meu lado. Sangram algumas delas. Outras, apenas vêm e vão. Estou ao alcance da minha sinceridade. Sejam então honestos comigo em sua interpretação. E senão o forem, como poderei eu sabê-lo?

Uma paisagem muda se faz lá no fundo. Em amarelo vivo e azul brutal faz-se ela sobre as ondas. Estou numa praia. Um ambiente que nunca poderei sobre ele tudo aprender. Depois que passa esse sentimento de deseducação, ou de inutilidade perante o vislumbre do máximo, sinto como se pudesse morrer. E morro a cada onda. Cada espuma, em seguida, ressuscita-me como se eu comandasse o movimento de asfixia e alta-oxigenação num vai e vem.

Nasci muito novo para não existir mais, disse dia desses. E quando vi que não ficaria velho, desci dos degraus das idades, para que pudesse me fazer nas palavras atemporais. Sinta um gosto de fim de vida, “você terá sua vida por inteiro no instante seguinte”, pensei. Não há remorso em testar a si próprio. Não há arrependimentos pelas virtudes não conquistadas. Acho que grito este ritmo do fracasso é o que menos desafina: sou tudo aquilo que a sociedade não quis admitir.

Escolhi sentir. A opção de viver, de uma vez por todas, percorre todas as minhas contradições, mesmo que viver me conduza ao seu oposto, o fim da respiração, e então de todos os meus versos.

Autor: Lucas Vinícius da Rosa