Suas mãos eram pequeninas. Quase não conseguiam abraçar as moedas da esmola recebida. Quando pedia, fazia da maneira como vira seu irmão mais velho realizar. Dissimulava uma desculpa qualquer pelo dinheiro. Pelo troco, pela vida.
Suas roupas eram trapos. Pedaços de tecido nada dignos de um ser humano. A pouca idade estampada no rosto contrastava-se a envelhecida vestimenta. Um calção de cor azul desbotada vestia seus membros inferiores. Nos superiores, uma camiseta de propaganda política, cujo número a ser votado designava a repugnância política da fome.
Suas qualidades ainda não foram descobertas. Ela não frequentou uma escola que lhe instruisse sobre suas propriedades. Fora conduzido pela didática da vida, que estuprava-lhe as oportunidades que sequer vislumbrou. Criança foragida, de educação contrabandeada; saqueada.
Suas lágrimas estavam já secas. Cansada de ferir-se pelo acaso, essa criança olhou pelo vidro do carro, em cujo assento estava o motorista implácavel, e estendeu a mão. Queria dinheiro, mas sobretudo um socorro. Eis a calamidade das diferenças humanas.
Suas virtudes drenavam o choro, que escorria pelo seu singelo rosto. Quando sozinha, suas lágrimas não tinham apoio de mãe, ou pai. Sua literatura escrevia-se pelas palavras deste escritor, maldito em ser sensível a essa realidade. Essa criança bebera lente envenenado, pela sociedade apática que não que chora, apenas bebe.
Suas mortes eram diárias. Cada vez que um transeunte atravessava a rua, em direção ao shopping center, o calor da pobreza era substituído pelo ar condicionado. E outra vez consumiam-se superficialidades em forma de produtos. E se comprava. E a criança ainda ali ao lado, no calor do deserto urbano. Incessantemente procurava oásis que lhe permitisse beber sem ser creditada.
Suas realidades ressuscitavam a tristeza. Ah, todavia, ainda assim ela sorria. Seus dentes de leite, ainda não arrancados, amamentavam a felicidade perante o medíocre.
— Volte mãe. Volte pai. – e ela sequer família possuia.
— Volte humanidade.
— Volte vida.
Suas mazelas, interpretáveis pelos poros de quem transpira vida, aquém do frio triste, é este texto quente. Evaporo se em contato com essas feridas sociais. A criança, longe da finalidade da qual gostaria de dar aos meus textos, agora repousa em silêncio; seu túmulo não possui lápide.
Autor: Lucas Vinícius da Rosa