Uma senhora surge na sacada. Suas rugas brilham sob o fulgor do sol. No varal, ela pendura com paciência um pano de prato; imagina-se que todos os dias ensolarados ela o faça pendurá-lo, de modo tão corriqueiro e acostumado, que seu coração se acalma neste gesto. Antes que o calor a incomode, recolhe-se para dentro do apartamento; é sábio que, na sua idade, não se deve expor demasiado aos ultravioletas. Ainda assim são maravilhosos os fins de semana em que o sol perdura do início ao fim, como uma dádiva merecidamente agradecida não só pelo pano de prato, mas pelo seu parente próximo, seu irmão Vinícius, que a visita nesta ocasião, e a aguarda na sala para uma conversa após o almoço.
Findo o domingo, o sol vai-se embora; e os habitantes da cidade sentem a lisonja de não terem visto uma gota d’água cair do céu. Os visitantes igualmente se maravilham. A visita fez-se justificada. Principalmente se vieram de longe. Quanto maior a distância, e mais fulguroso fora o sol, mais agradáveis as circunstâncias para se aproveitar a praia, as brisas litorâneas e, talvez, melhor ainda fossem os ânimos dos parentes na mesa de almoço; os panos de prato também estariam mais secos.
Vinícius lembra-se de acenar e buzinar três vezes, ao zarpar com seu carro, em frente ao apartamento de sua irmã.
— Avise-me quando tiver outro fim de semana perfeito como este, mana. Bip, bip, bip.
— Avisarei! – e sorri com o braço direito esticado, tão resplandecente como o sol de horas antes.
Assim que seu irmão vai-se embora, lembra-se, de súbito, que após muitos dias de sol é comum a chuva intensa. E como o pano de prato estivesse exposto, no varal da sacada, corre para seu apartamento. Tira o pano das grades brancas do varal. “Que bom que a chuva tardou a vir, apenas no final do domingo”, pensa ela com conforto, enquanto guarda os prendedores na minúscula cestinha presa à parede.
Vinícius não lhe visitava fazia dois anos. Na ocasião anterior, tivera o infortúnio de ser acometido por um vendaval fora de época. O vento frustrara não só os passeios com sua irmã, mas também, à época, foi o pano de fundo da separação com sua ex-esposa. Assim como sua irmã, Vinícius acreditava que apenas fins de semana de sol eram aqueles em que se vivia a vida intensamente. Dois idealistas, cada um à sua maneira, os dois irmãos enxergavam na insolação o gozo, no vendaval, a separação. Para sua irmã, que morava sozinha num belo todavia solitário apartamento, os dias seriam melancólicos exceto quando fizesse sol, e ela pudesse pendurar o pano de prato no varal; adicionalmente quando seu irmão a visitasse, o que naturalmente também dependia do tempo.
Autor: Lucas Vinícius da Rosa